Em defesa das mãos

Comecei a ler o livro de Matthew Crawford sobre o trabalho manual, Shop class as soulcraft: an inquiry into the value of work. Nele, seu autor considera o trabalho manual ou “técnico” como uma espécie de “antídoto” ao trabalho “pós-industrial”, com sua apologia à “manipulação de idéias” e conhecimento em vez de objetos reais, com resultados tangíveis.

Pesquiso, desde 2006, as “indústrias criativas”. Um dos principais mentores dessas indústrias, Richard Florida (pelo menos seu mentor “pop”), defende que os empregos, na pós-modernidade, são criativos-orientados. Nessa perspectiva, não resta espaço para uma infinidade de outros trabalhos cuja principal atividade consiste em manipular objetos com as mãos. Florida é um dos alvos deste livro.

Crawford escreve este livro para mostrar que os trabalhos técnicos (aqui no Brasil, pensem em todos os profissionais formados pelo sistema S: Sesi/Senac/Senai), ou seja, aqueles que dependem de um curso profissionalizante, e não de um diploma universitário, são uma fonte fundamental de prazer e significado, pois permitem atender a uma necessidade ontológica da modernidade: a capacidade de agência, isto é, o fato de sentirmos que temos controle e que podemos afetar, concretamente, a realidade (por exemplo, ao consertar uma moto – Crawford é proprietário de uma oficina que conserta motos antigas).

Estou gostando das idéias do autor. Ela nos alerta para os aspectos invisíveis de muitos “metiês” (ou trades) desvalorizados pela histórica cisão entre trabalho manual e trabalho intelectual. Crawford, apoiando-se em boa literatura, mostra a falácia dessa separação, além de nos chamar a atenção para a perigosa situação dos trabalhadores “intelectuais”, alienados pelas ideologias da sociedade “pós-industrial”.

Vamos ver o que mais a leitura deste livrinho interessante, e premiado com o The New York Times Book Review (e muitos outros), tem a nos ensinar.