Comendo e pensando

Acredito que tenha sido Schopenhauer quem, em certa feita, tenha dito que o ser humano é, ponto-a-ponto, semelhante a um animal (acho que ele mencionava a semelhança com a aranha): pesadamente preso à sua rotina e dominado pela “vontade” (no caso do ser humano, uma espécie de “disfarce” da natureza em imagens e desejos mentais).

Olhem este Koala (“nova sensação” de cliques no Youtube): comendo uma maça, “pensando” na vida. Nossa primeira tendência é “humanizar” a situação, atribuindo-lhe algum significado (ele come e “pensa”, medita…por exemplo: sobre a dificuldade da população koala em viver junto às grandes cidades, ou sobre a situação precária em que ele próprio se localiza – a julgar pelo lugar “improvisado” em que está…).

Poderíamos trocar a situação e colocar um humano em seu lugar: com uma garrafa de cerveja na mão, ficaria com o olhar perdido no ali e no aqui, sob sol forte e calor, refletindo sobre as escolhas não feitas, ou sobre a impertinência atual de escolhas feitas no passado (muitas destas escolhas, inclusive, sem qualquer ponderação à época, simplesmente tomadas no fluxo dos acontecimentos de então).

É “lógico” que essa descrição do Koala é antropomorfista. O animal simplesmente come. Ele está preso ao momento presente. Está preso à maça que agora come, sem, penso eu, qualquer indício antecipado e reflexivo de que logo virá outra maça, ou então de que continuará na luta selvagem (se bem que hoje nem tanto, considerando nossa “invasão” da natureza, com sua consequente humanização…) pela sobrevivência.

É isso que às vezes muita gente confunde: trata o simples movimentar do corpo (seja de um animal-koala ou um animal-humano) como uma ação intencional. Além das explicações dos etólogos, biólogos e Cia, o que nos diferencia dos animais é o fato de nossas ações serem intencionais e executadas no enquadre de razões e esquemas intelegíveis. Mas é verdade que, mesmo sendo um ser humano, suas ações podem estar destituídas de qualquer significado.

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Complemento extemporâneo:

Se pensarmos em muitos manuais de Comportamento Organizacional, logo notaremos a semelhança de raciocínio: se alguém, no trabalho, está com baixo rendimento ou cabisbaixo, logo se lhe atribuem desmotivação, insatisfação e outros gêneros subjetivos. É patética nossa necessidade de tentar interpretar situações que, às vezes, são absolutamente desprovidas de qualquer signficado, exceto, neste caso, que precisamos muitas vezes trabalhar sem qualquer outro “significado” que não o dinheiro (= a maça) no final do mês. É muito romantismo e prepotência achar que somos “radicalmente diferentes” ou “absurdamente iguais” a esse singelo Koala.