Pedagogia inversa

O que um pupilo do Instituto Benjamenta é sei eu bem, é óbvio. Um bom e redondo zero à esquerda, nada mais. Robert Walser

Walser foi, como se diz por aí, um grande influenciador de Kafka, Musil e Walter Benjamin. Nasceu na Suíça e morreu, demente, em um manicômio. Sua morte ocorreu precisamente no natal de 1956, durante uma de suas caminhadas solitárias.

Em um de seus livros, que leio no instante, Jakob Von Gunten, vemos uma espécie de “pedagogia reversa” em ação. O personagem, Von Gunten, é um jovem que escreve um diário relatando suas experiências no Instituto Benjamenta, uma espécie de escola dos fracassados, onde a formação visava incutir “paciência e obediência, duas qualidades que pouco ou nenhum proveito prometem”. Não há professores – quer dizer, os que havia, se foram! A única lição passada, repassada e repisada era a própria norma de funcionamento do tal Instituto. Os alunos do Instituto Bejamenta, “umas coisas muito pequenas e subalternas”… nunca seriam nada na vida.

O livro foi escrito em 1909, terceiro romance de Walser e, segundo se informa, seu preferido.

Não sei há paralelos, mas tome-se, por exemplo, o livro Os anos de aprendizado de Wilhelm Meister, de Goethe. Acompanhamos ali o tortuoso processo de crescimento e de formação moral, psicológica e social do jovem Wilhelm. Numa trilha romântica, ele “se torna alguém” à medida que vai “se descobrindo”. No romance de Walser, não; aqui, Von Gunten e seus colegas não vão se tornar ninguém.

Tornar-se alguém: essa é a grande injunção da modernidade iluminista. Mantra poderoso e indiscutível de qualquer sistema pedagógico, do tradicional ao construtivista, e além. Nenhuma escola, pública ou privada, pode se furtar à missão de transformar seus pupilos em “alguém”, em um “indivíduo”. As privadas, porém, a duras penas tentam dissimular sobre a brutal contradição que espera seus pupilos no futuro mercado “altamente competitivo”. Mercado, cuja lógica permanecerá sendo desemprego em alta, exigências de formação… também em alta, sempre! Paradoxo torpe.

Walzer parece uma pequena e ardente voz em sentido contrário ao mantra do “tornar-se alguém”.