A psicologia da lerdeza

No post anterior falei do “mal” do ansioso, embora meu texto tenha ficado ligeiramente ambiguo. Agora, aproveitando o ensejo, gostaria de dizer umas palavras sobre a lerdeza. Há, logo de cara, um certo torcer de nariz quando se fala que alguém é lerdo, pois isso é moralmente muito carregado: nenhuma pessoa chamada de “lerda” vai ficar feliz com isso!

Mas, deixando a frivolidade dos espíritos fracos, daqueles que não vão além das obviedades, o que  poderíamos perguntar à lerdice? Ela nos poderia dizer algo? Ela pode nos dizer o seguinte: o lerdo é alguém defasado com o ritmo das outras pessoas. Ele vive o tempo dele. Se o ansioso vive o tempo dele para mais, o lerdo vive o tempo dele para menos: tudo e todos podem esperar! Numa visão mais negativa, é algo como: “que se danem os outros, eu tenho meu tempo; quem quiser, que me engula!”.

Mas o “lerdo” pode ser também uma pessoa que sabe degustar o tempo das coisas, ou seja, que não vê seu “eu” ameaçado quando as coisas não saem no tempo desejado. Ele está, como se diz popularmente, “de boa”. Claro que, nos contextos de trabalho “competitivos”, não há espaço para o “lerdo”, pois ele frequentemente perde o bonde da história. Mas, em outros contextos (lembremos que “os contextos competitivos” são 1% da humanidade), a lerdisse tem seu espaço e sua vez.

Junto com a lerdisse emerge a própria característica do sujeito. Se o rápido, na visão de senso comum, é taxado de ansioso, frívolo, instável, superficial, o “lerdo” é deixado à sua própria sorte: ele está dizendo, muitas vezes, que ele “está fora”, que ele não depende de sua imersão naquilo que ele acha que é “o ritmo dos outros”. Ele pontua-se: eu sou eu, vocês que fiquem com o ritmo de vocês! Tanto no caso do ansioso como neste do sujeito com uma temporalidade diferente (mais “lenta”), temos o mesmo ponto: é preciso posicionar-se.

Acho que deveríamos pensar mais sobre a lerdice, para além dos preconceitos boçais. Ela diz muito, mas muito mesmo, sobre as relações sociais, sobre normas, sobre padrões, sobre sintonização e, especialmente, sobre timing. Aliás, isso é muito importante: timing, o fato de se obter algum tipo de sincronia fenomênica: entre eu-outro-coisas-situação.